PRESSUPOSTOS DA INTERTEXTUALIDADE
a) Conceito de intertextualidade;
b) pressuposto da intertextualidade – o texto e o discurso.
c) pressupostos do texto: codificação + enunciação ou ato ilocucional
d) requisitos do discurso: decodificação + repertório (conhecimento do mundo)
d) conceito de texto – por texto podemos entender toda manifestação linguística provida de enunciação
e) a intertextualidade explícita ou implícita;
f) a intertextualidade intencionalmente implícita – o plágio
g) a importância do repertório.
1 - O QUE É INTERTEXTUALIDADE?
Tem-se definido a intertextualidade com sendo o diálogo de um texto com outro texto. É o dialogismo. Mikhail Bakhtin define como sendo o processo de interação entre textos. Interação, ação entre, Textos agindo entre si.
Não me parece boa a definição. Ora, um texto não dialoga com outro texto. Não age nem reage um em face do outro. O que acontece é que os textos, em convívio, formam uma trama textual, resultando num tecido, que nada mais é que um contexto, ou seja, texto mais texto, ou, melhor ainda, texto com texto. O resultado é o CONtexto.
Ressaltando a trama, a urdidura ou o urdume do tecido textual, pode-se, em vez de COM, que aparece em CONtexto, optar pelo prefixo INTER, com o sentido fundamental de ENTRE, NO MEIO DE, e teremos o INTERtexto, cuja resultante é a INTERtextualidade.
Melhor seria dizer que a intertextualidade é a presença ou a revelação, ainda que tênue, de elementos de um texto em outro texto, isto é, a trama intertextual – a trama urdida entre textos. A intertextualidade implica, pois, na identificação ou no reconhecimento, num texto maior, de remissões ou referências (explícitas ou implícitas), a obras ou trechos de obras constitutivas de outro texto. Como já se disse acima e não é demais repetir, m A própria palavra intertextualidade diz tudo – relação entre (inter) textos.
Resumindo: A intertextualidade é texto mais texto, ou texto entre texto, formando uma trama textual.
Com maior economia fabular:
intertextualidade é a interação velada ou revelada entre textos.
2) – TEXTO E DISCURSO
Impossível discorrer sobre contexto, textualidade ou intertextualidade, sem noções básicas e claras do que seja texto, discurso e repertório.
Ora, o texto, como componente da textualidade, como seu pressuposto, é sua matéria prima – a textualidade se compõe de texto.
O que é texto? É a pergunta que se faz.
Emm princípio, todos sabem que o étimo da palavra texto é o latim textum, que significa tecido, entrelaçamento. O texto resulta de um trabalho de tecer, de entrelaçar os fios, cujo resultado é o tecido. Esse é sentido etimológico. Interessa-nos, contudo, aqui, não apenas o sentido lingüístico, mas o sentido linguístico-literário.
Contudo, tem-se definido texto das mais diversas maneiras:
Fávero e Villaça Koch concluem que é lícito tomar o termo texto em dois sentidos: um lato e o outro restrito.
“Texto, em sentido lato, designa toda e qualquer manifestação da capacidade textual(sic)1 do ser humano.” Fávero et al.2
E aí se incluem as manifestações verbais, musicais, pictóricas; a dança, a escultura; enfim.toda manifestação especificamente comunicativa ou etimologicamente comunicativa, i.é, que ativa universos interiores comuns: COMUNicar.
As autoras, antes de conceituar texto, no sentido estrito, amarram-no ao discurso: “Em se tratando da linguagem verbal, temos o discurso, atividade linguística de um falante, numa situação de comunicação dada, englobando o conjunto de enunciados produzidos pelo locutor (ou por este e seu interlocutor, no caso do diálogo) e o evento de sua enunciação. O discurso é manifestado, linguisticamente, por meio de textos (em sentido estrito).”1 Segue-se o conceito de texto:
“Neste sentido, o texto consiste em qualquer passagem.falada ou escrita, que forma um todo significativo, independente de sua extensão”3
Finalmente, entendendo a enunciação como a intenção comunicativa do emissor, por texto podemos entender toda manifestação linguística provida de enunciação. É o nosso conceito.
O DISCURSO
O termos discurso comporta dois conceitos básicos: Câmara afirma que é o termo que melhor corresponde em português ao termo francês PAROLE, estabelecido por Saussure, e conceitua: “É a atividade lingüística nas múltiplas e infindáveis ocorrências da vida do indivíduo.”4
Aqui tomaremos o termo discurso no sentido que lhe dá a Teoria Literária e que é o adotado por Atônio Soares Abreu5.
Segundo Soares Abreu, o discurso é dinâmico e histórico.
O discurso comporta dois momentos: o primeiro é o da codificação do texto; o segundo é o da sua decodificação. Ele percorre, pois, um caminho, e esse caminho é linear: do autor ao leitor ou do falante ao ouvinte. O discurso além de linear é histórico: envolve um termo inicial e um termo final; o dies a quo e o dies ad quem – ou seja: a) o termo da composição, da codificação (texto) e b) o termo da decodificação, cuja soma (a + b) é o discurso.
O REPERTÓRIO, ou O CONHECIMENTO DO MUNDO
Em face da intertextualidade, devemos distinguir entre conhecimento lingüístico e conhecimento do mundo. Ambos são necessários para interpretar um texto. Travaglia e Vilaça Koch lecionam: “Se o conhecimento lingüístico é necessário para o cálculo da coerência, todos os estudiosos são unânimes em afirmar que tal conhecimento é apenas parte do que usamos para interpretar um texto e, portanto, para estabelecer sua coerência. O estabelecimento do sentido de um texto depende em grande parte do conhecimento do mundo dos seus usuários, porque é só este conhecimento que vai permitir a realização de processos cruciais para a compreensão...”
O repertório é um dos fatores mais importantes para o reconhecimento da intertextualidade.
A intertextualidade explícita não oferece qualquer dificuldade de reconhecimento. Segundo Ingedore Villaça Koch6 (e aqui já temos uma intertextualidade explícita), “A intertextualidade será explícita quando, no próprio texto, é feita menção à fonte do intertexto, isto é, quando um outro texto ou um fragmento é citado, é atribuído a outro enunciador; ou seja, quando é reportado como tendo sido dito por outro ou por outros generalizados (“como diz o povo...”, “segundo os antigos...”).
“Como diz o povo...”, “segundo os antigos...”, “segundo voz geral...” são expressões que suprem a indicação direta da fonte e marcam que se trata de citação ou de intertextos explícitos. São igualmente indicadores da intertextualidade explícita.
Já a intertextualidade implícita não cita a fonte: “Tem-se a intertextualidade implícita quando se introduz, no próprio texto, intertexto alheio, sem qualquer menção explícita da fonte, com o objetivo quer de seguir-lhe a orientação argumentativa, quer de contraditá-lo, colocá-lo em questão, de ridicularizá-lo ou argumentar em sentido contrário.”6
Na intertextualidade implícita é tarefa do leitor descobrir da presença do intertexto. Muitas vezes essa tarefa não é fácil.
Em se tratando da paráfrase, espécie de intertextualidade implícita, o reconhecimento do intertexto não chega a oferecer dificuldade porque ela deixa marcas evidentes do intertexto
Há, todavia, outras espécies de intertextualidade implícita: a paródia, o pastiche e o plagio. Nas duas primeiras não há a preocupação de ocultar a presença do intertexto. Na última, contudo, no plágio, a ocultação faz parte de sua natureza: “...o plágio seria um tipo particular de intertextualidade implícita, com valor de captação, mas no qual, ao contrário dos demais, o produtor do texto espera (ou deseja) que o interlocutor não tenha na memória o intertexto e sua fonte (...), procurando, para tanto, camuflá-lo por meio de operações de ordem lingüística, em sua maioria de pequena monta (apagamento, substituições de termos, alterações de ordem sintática, transposições etc.).”6
O que pretendemos deixar claro aqui é que sem o significativo “conhecimento do mundo”, sem um “repertório” de certa forma alentado ou expressivo, o interlocutor não terá condições de reconhecer o intertexto latente, mormente o intencionalmente dissimulado.
Ressalta-se, assim, a importância do repertório na decodificação do texto.
1 Não é boa técnica inserir na definição o termo definido: texto/textualidade
2. Linguuística Textual: Introdução.
Fávero – Leonor Lopes e Villaça Koch – Ingedore G. - Cortez. São Paulo. 1983.
Pág. 25
3. A Coerência Textual.
Ingedore Villaça Koch e Luiz Carlos Travaglia.Contexto, 2008
4. Dicionário de Linguuística e Gramática.
Câmara Jr – Joaquim Mattoso. Vozes. Petrópolis. 1978
5 – ABREU – Antônio Soares
Curso de Redação
6 – INTERTEXTUALIDADE: Diálogos Possíveis
Villaça Koch – Ingedore G. et al.
Córtex Editora – sem data.