segunda-feira, 10 de maio de 2010

Trabalho Forense

TRABALHO FORENSE

Pedro Junqueira Bernardes
Raul Moreira Pinto
Advogados.

Danos morais à pessoa jurídica - endosso-mandato e responsabilidade do mandatário - fixação do valor da indenização.

Trata o trabalho de defesa apresentada em ação de indenização por danos morais.
A autora, empresa do ramo de comunicações, pretende ver-se ressarcida por pretensos danos causados pelo protesto de duplicatas simuladas contra ela sacadas. Dirigiu a ação à sacadora e a dois bancos endossatários das referidas duplicatas, em litisconsórcio. Segundo sustenta a autora, seriam os dois bancos responsáveis pelo protesto das cambiais.
A presente defesa foi deduzida em favor do último endossatário, correspondente do segundo réu.
A resposta é aberta com duas preliminares, pretendendo o réu a extinção do processo sem julgamento do mérito. Depois, são suscitadas questões que pertinem ao mérito. Ei-la adiante transcrita:
“1. - Inepta mostra-se a inicial por pretender formar litisconsórcio fora das hipóteses previstas na lei.
Com efeito, o caso trazido a juízo não se enquadra em nenhum dos permissivos dos incisos I a IV, do artigo 46, do C.P.C.
1.2 - A Autora pede sejam declarados inexistentes os débitos com o conseqüente cancelamento do protesto dos títulos a eles relativos.
1.3 - O ora Contestante era apenas mandatário do segundo Réu, Banco Y, fato demonstrado pelo documento de fls. 17, juntado pela própria Autora.
1.4 - Como mandatário, o ora Contestante cumpriu as ordens do mandante, o segundo Réu, negando, aqui, expressamente que tenha sido cientificado “extrajudicialmente” da existência de duplicata simulada
1.5 - Assim, têm-se três causas de pedir, com pretensões distintas relativamente a cada um dos réus:
a) a inexistência de venda mercantil, que diz respeito a falta de causa debendi das duplicatas que alega terem sido protestadas ilegalmente;
b) como conseqüência, os protestos teriam sido tirados irregularmente pelo ora Contestante, por ordem do primeiro Réu ou do segundo, alternativa que se sugere por não estar esclarecido na inicial se as malsinadas duplicatas foram às mãos do segundo Réu por endosso-mandato, endosso-caução ou endosso simplesmente translativo;
c) por indevidos os protestos, teria havido dano moral à Autora.
Como se observa, na letra a revela-se uma lide entre a Autora e a primeira Ré; nas letras b e c, outra lide entre Autora e os dois últimos Réus.
1.6 - Não é possível, data venia, cumulação subjetiva em que se ponha em um único processo mais de uma lide envolvendo obrigações distintas de litisconsortes.
Vem a talho a lição Araken de Assis: “duas ou mais pessoas não podem litigar em conjunto, quer agindo na demanda, quer reagindo à demanda, senão a vista de explícita permissão legal. Mesmo alargada a disciplina, constante do artigo 46, relativamente àquela do artigo 88, do Código derrogado, isto não significa, ao invés, que alguém possa se litisconsorciar fora dos números ali previstos. O elenco do artigo 46 é taxativo”. (Cumulação de Ações, Revista dos Tribunais, 3a. edição, 1.998, pag. 166/167).
Segundo o mesmo autor, “não cabe ao juiz escolher, entretanto, o autor ou o réu a ser preservado no processo, haja vista o princípio da demanda, ou venceria os limites da própria iniciativa.” (op. citada, pag. 199)
Assim, há de ser indeferida a inicial, com extinção do processo, por inadequação procedimental (artigo 295, inciso V, e artigo 267, inciso I, tudo do C.P.C), lastreando-se o ora contestante no entendimento de Araken de Assis (op. citada, pag. 199), condenando-se a Autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios.

Da ilegitimidade de parte

2. - O segundo Réu, Banco Y, tendo como correspondente na cidade de São Sebastião do Paraíso o ora Contestante, confiou a este a cobrança dos títulos descritos nas certidões de fls. 17.
2.1 - Não tendo os títulos sido liquidados nos respectivos vencimentos, o ora Contestante, seguindo as instruções do mandante, segundo Réu, tirou o protesto dos mesmos, por indicação, conforme se vê da certidão. Os títulos foram protestados por falta de aceite.
2.2 - De observar que a Autora tinha ciência da condição de mandatário do ora Contestante.
Com efeito, afirma a Autora na inicial que os Réus bancos “aceitaram” as duplicatas em desconto, sendo certo que os títulos foram transferidos pelo Réu Y ao ora Contestante. Ora, se houve transferência, conseqüentemente, não poderiam ter sido os mesmos títulos descontados junto ao ora Contestante e ao Banco Noroeste, a não ser em redesconto, mas essa operação não é possível entre bancos privados.
2.3 - Na verdade, a Autora lançou no pólo passivo do processo os dois Réus bancos para se garantir de um insucesso de uma possível execução contra a primeira Ré, verdadeiramente quem agiu contra a lei e que possivelmente não tem solvabilidade para arcar com indenização no patamar pretendido pela mesma Autora.
2.4 - É meridianamente claro que, se o Contestante detinha os títulos na condição de endossatário-mandatário, é parte ilegítima ad causam, pois mero procurador do segundo Réu.
Diz o Código Civil, em seu artigo 1.288, que “opera-se o mandato, quando alguem recebe de outrem poderes, para, em seu nome, praticar atos, ou administrar interesses.”
O professor Caio Mário da Silva Pereira leciona que “O mandatário, embora emita declaração de vontade, o faz em nome e no interesse do mandante, em que persiste a titularidade dos direitos e obrigações. Como resultado, obriga-se o mandante, cujo principal e mais importante dever é responder perante o terceiro, com seu patrimônio, pelos efeitos da declaração de vontade emitida pelo representante, cumprindo as obrigações assumidas dentro dos poderes outorgados.” (Instituições de Direito Civil, Ed. Forense, 7. edição, 284).
Tratando especificamente do endosso-mandato, assim se pronuncia Fran Martins: “Esse chamado endosso-mandato ou endosso-procuração é, na realidade, um falso endosso, pois nem transmite os direitos emergentes do título nem transfere a propriedade da letra, mas simplesmente a sua posse. De fato, detentor do título por endosso-mandato, recebe-o e pratica todos os atos de proprietário do mesmo, mas o faz como simples mandatário, representando e obrigando, neste caso, o mandante ou endossante” (Títulos de Crédito, ed. Atlas, 1.996, pag. 168/9, destaque do Contestante)
Assim, “no simples endosso-mandato, responsável é exclusivamente o mandante pelos atos praticados por sua ordem pelo banco endossatário”, como decidiu o C. S.T.J. (Resp 12118-RJ, Rel. Athos Gusmão Carneiro, DJU 21.09.92, pag. 15694)
Celso Barbi Filho, em excelente trabalho publicado no Boletim da Escola Superior de Advocacia, OAB - MG, observa, com precisão que, no endosso-mandato, “o endossatário portador do título não exerce direito próprio, mas sim do endossante que lhe transferiu a duplicata para simples recebimento. É uma prática comum nos serviços de cobrança bancária, em que o sacador/endossante não desconta o título junto ao banco, mas apenas contrata sua prestação de serviços para cobrança. A tal propósito, já decidiu o Tribunal de Justiça do Distrito Federal que ‘o estabelecimento bancário que recebeu o título apenas para cobrança não é credor, mas mero procurador, sendo válido o pagamento efetuado diretamente ao endossante, verdadeiro titular do crédito.” (Protesto de Duplicata Simulada e Procedimentos Judiciais do Sacado, jan/mar 1.998, pag. 108).
Continua o ilustre professor mineiro: “Com isso, fica evidente que a eventual ação judicial do sacado vitimado com a cobrança indevida de duplicata simulada não poderá dirigir-se contra o endossatário/mandatário.”
Julgando caso idêntico ao ora examinado, decidiu o Colendo S.T.J. que “No endosso-mandato, o endossatário não adquire a propriedade da cambiariforme, mas apenas a posse direta”...“Não deve o banco ser condenado ao pagamento de perdas e danos em favor do sacado, pois a responsabilidade é, em princípio, exclusiva do sacador, que criou o título abusivamente.”...“Cumpria ao mandatário aplicar sua diligência na execução do mandato, sob as instruções do mandante, inclusive tentando o protesto das cambiais. Recurso Especial conhecido e provido.” (Resp 0001013, Rel. Min. Athos Carneiro, publ. DJ 11.12.89, pag. 18140).
Também cuidando de endosso-mandato, o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assentou que a “responsabilidade do banco mandatário (ocorre) somente perante o credor mandante”.
Assim, pelas razões expostas, deverá ser extinto o processo sem julgamento do mérito, na forma do inciso VI, do artigo 267, do C.P.C, isto se V. Exa. não entender que melhor se enquadra o caso no artigo 295, inciso II, do mesmo diploma.
Caso V. Exa. veja como possível salvar o processo, requer, mui respeitosamente, que, de plano e através de decisão interlocutória, exclua o Contestante do processo, condenando-se a Autora ao pagamento da verba honorária em favor do procurador deste.
Data venia, essa exclusão de plano é necessária, pois, com a saída do ora Contestante do processo, o que fatalmente ocorrerá, pode haver deslocamento de competência, vez que nenhum dos dois Réus remanescentes possuem agência ou filial nesta cidade.
Possível argüição de incompetência em razão do lugar por esses Réus poderá causar demora na solução final do feito, se o mesmo Contestante for somente excluído na decisão que extinguir o processo pelo mérito.

Do mérito.

Se ultrapassadas as preliminares suscitadas, o que se admite apenas para argumentar, melhor sorte não tem a Autora no mérito, como se verá.

Do exercício regular do direito.

3. - Se endosso-mandato não houvesse, ainda assim não seria ilegítimo o levar a protesto as malsinadas duplicatas.
Dispõe o artigo 160, do C.C.B., que não constituem atos ilícitos os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido (inciso I).
A Lei de Duplicatas, artigo 13, parágrafo 4º, estabelece a obrigatoriedade de levar a protesto duplicata no prazo de trinta dias, contados da data do seu vencimento, pena de perdimento do direito de regresso contra os endossantes e avalistas destes.
Neste sentido, decidiu o Excelso Supremo Tribunal Federal: “Descontado o título, o estabelecimento bancário levou-o a protesto por falta de pagamento. Não pode ser condenado a pagar perdas e danos, em virtude de protesto. De acordo com o artigo 13, parágrafo 4º, da Lei nº 5.474/68, o portador que não tirar o protesto da duplicata, em forma regular e dentro do prazo de trinta dias, contados da data do seu vencimento, perde o direito de regresso contra os endossantes e respectivos avalistas. O Banco, ao mandar a protesto duplicata, exerce um direito (o de protestar o título), como condição para conservação de um outro (o de regresso). Não pode ficar sujeito a indenizar eventuais prejuízos sofridos pela ora autora, com o protesto, porque não constitui ato ílícito o que é praticado no exercício regular de um direito. (CC, art. 160,I)” (apud Yussef Said Cahali, in Dano Moral, Revista dos Tribunais, 2a. edição, 1.998, pag. 380).
Observa Celso Barbi Filho que “Os tribunais, inclusive o S.T.F. e o S.T.J, nunca negaram o direito do (sic) endossador levar o título a protesto para exercício do regresso cambial, mesmo quando seja uma duplicata simulada. Por isso mesmo, a jurisprudência, tanto daqueles pretórios superiores, quanto das cortes estaduais, repele os pleitos indenizatórios de sacados contra endossatários que levam duplicatas simuladas a protesto.” (op. citada, pag. 94).
Assim, se endosso-mandato não existisse, repita-se, o ato de tirar o protesto seria legítimo, porque somente com ele se resguardaria da decadência do direito de responsabilizar os endossantes e seus avalistas.
Por outra lado, admitindo-se tenha havido endosso-mandato, o ora contestante, como procurador do segundo réu, tinha obrigação legal de levar o título a protesto, pena de ver-se obrigado a indenizar o mandante, por ter, em razão de omissão, causado a perda do direito de regresso.
Dessa forma, não havendo conduta ilícita por parte do ora Contestante, não há se falar em composição de danos, sejam patrimoniais sejam morais.

Dos danos morais à pessoa jurídica

4. - Muito se tem discutido sobre a possibilidade de a pessoa jurídica sofrer danos morais.
Alinha-se a ora Contestante entre aqueles que concluem pela inviabilidade de sofrer pessoa jurídica danos daquele tipo.
Se a pessoa moral sofresse ofensas a honra, ter-se-ia de admitir que, paralelamente, se lhe cobrasse comportamento ético.
Ao que se sabe, ninguém recrimina esta ou aquela pessoa jurídica porque, visando exclusivamente o lucro, reduziu custos demitindo empregados, ou, por manobra especulativa, tenha levado alguém à falência. Na verdade, em casos como tais, a recriminação recai, e com toda a razão, na pessoa dos sócios ou dos seus dirigentes.
Assim também se a pessoa jurídica sofre abalo no seu bom nome comercial tal fato será fatalmente creditado ao mau gerenciamento dos proprietários. Aqui, a ofensa é às pessoas físicas destes, mesmo porque não se pode lançar culpa de má administração à pessoa jurídica, à falta de vontade desse ente.
Na verdade, danos morais, em casos como o ora tratado, sofreriam os administradores da empresa e somente eles teriam legitimidade para postular ressarcimento na justiça.
Enfrentando a questão, o jurista Adroaldo Furtado Fabrício bem a solucionou, em acórdão de que foi o relator, afirmando: “Tudo o que se possa imaginar como conseqüência de uma ofensa, injúria ou insulto tomará a forma de menos valia econômica, na medida em que o conceito e a credibilidade no mundo dos negócios, a oportunidade de ganhos futuros, a redução dos lucros atuais e a cessação dos esperados, as restrições ao crédito são sempre valores econômicos e não morais. As pessoas jurídicas só podem ser prejudicadas em suas finalidades, não em sua essência de pessoa: o dano que assim se traduza será sempre dano econômico inclusive quando se trata do bom-nome, da credibilidade pública e da decorrente redução de oportunidades de ganho. O dano à auto-estima, ao amor-próprio, pode eventualmente alcançar, por via reflexa, os membros de uma sociedade, mas nesse caso, por estes e em seu favor, tem de ser postulada a correspondente indenização.” (apud Luís Alberto Thompson Flores Lenz, in Dano Moral Contra A Pessoa Jurídica, RT-734, dezembro de 1.996, pag. 62).
Em lapidar acórdão, a 5a. Câmara Cível do T.J.R.J. acolheu a tese da impossibilidade de pessoa jurídica ser sujeito passivo de dano moral. Essa decisão veio assim ementada: “A pessoa jurídica não pode ser sujeito passivo de dano moral. O elemento característico do dano moral é a dor em sentido mais amplo, abrangendo todos os sofrimentos físicos ou morais, só passível de ser verificado nas pessoas físicas. O ataque injusto ao conceito da pessoa jurídica só é de ser reparado na medida em que ocasiona prejuízo de ordem material.” (apud Luiz Antonio Rizzato Nunes e Mirela D’Ângelo Caldeira, in O Dano Moral e sua Interpretação Jurisprudencial, Saraiva, 1.999, pag.877)
No voto condutor do acórdão, vêem-se preciosas citações de Wilson Mello Silva: “Não é o dinheiro, nem coisa comercialmente reduzida a dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuída à palavra dor o mais largo significado.”
“...”
“As pessoas jurídicas em si jamais teriam direito a reparação por danos morais. E a razão é óbvia. Que as pessoas jurídicas sejam, possivelmente, responsáveis por danos morais, compreende-se. Que, porém, ativamente, possam reclamar as indenizações, conseqüentes deles, é absurdo.”
“...”
“Ora, a pessoa jurídica não é um ser orgânico, vivo, dotado de um sistema nervoso, de uma sensibilidade, e, como tal, apenas poderia subsistir como simples criação ou ficção do direito.”( op. citada, pag. 854/855).

Essa orientação prevaleceu também na Apelação Cível nº 75232, Rel. Des. José de Campos Amaral, TJDF, publ. D.J. de 22.03.95 e na Apelação Cível nº 93.235, Rel. José de Campos Amaral, TJDF, publ. 16.04.97.
Na verdade, o “abalo ao bom nome comercial” e à honra objetiva somente podem traduzir-se em dano patrimonial, porque a pessoa jurídica não se entristece, não se acabrunha e não se sente humilhada, de modo a ensejar uma reparação, pagamento do pretium doloris, que lhe compense estados de espírito dolorosos exclusivos do ser humano.
Tudo, na verdade, se reduz a interesse econômico. O abalo de crédito e do bom nome comercial somente tem alguma razão de ser afirmado se influir na obtenção de crédito e no faturamento.
Alguem seria capaz de admitir, ou melhor, sequer imaginar, que uma gigante multinacional tenha seu bom conceito comercial e seu crédito abalado por um protesto cambial de título de pequeno valor? Se admitir que não, teríamos de concluir que, de princípio, apenas as pequenas empresas poderiam sofrer danos morais por esse tipo de ilícito, o que conduziria ao absurdo.
A bem da verdade, a Autora sinalizou para um correto equacionamento da questão, ao invocar expressamente o artigo 1.059, do C.C.B., que cuida das perdas e danos, mas ante a dificuldade de demonstrar prejuízos concretos, parece ter abandonado a tese, ficando na mera transcrição daquele dispositivo.
De fato, no caso de pessoa jurídica, os danos patrimoniais seriam as perdas já ocorridas e os “morais”, como perda do bom nome comercial, do conceito entre os fornecedores e abalo de crédito se concretizariam exatamente nos lucros cessantes.
Diante de todos esses argumentos, se chega inafastavelmente à conclusão de que os danos que se têm como morais à pessoas jurídicas não passam efetivamente de danos patrimoniais e nesse enfoque, para serem reparados, hão de ser devidamente provados.
Se nenhum prejuízo patrimonial tem a pessoa jurídica com atos tidos como ilícitos, qualquer indenização que se lhe conferir terá como causa o ressarcimento por estados de espirito dos seus responsáveis.
Por tais razões, deve ser julgado improcedente o pedido de indenização por danos morais, por impossibilidade de a pessoa jurídica ser sujeito passivo desse ilícito.

Do valor da indenização

6. - Tormentosa é a questão da fixação do valor da indenização do dano moral.
À impossibilidade de medir a intensidade da dor para estimar o quantum reparatório, inúmeros parâmetros são adotados pelos Tribunais.
Tomam-se a capacidade econômica do ofensor, a posição social e até mesmo a condição financeira do ofendido, o grau de culpa do ofensor, etc.
Alguns desses parâmetros têm origem legal, como são os casos do artigo 84, da Código Nacional de Telecomunicações e do artigo 53, da Lei nº 5.250/67.
Entretanto, no caso de pessoa jurídica é de se salientar que inexiste o sentimento de dor, moral ou física, cujo valor se torna possível de ser estimado apenas para se dar cumprimento à lei. Não há como estimar a dor pela perda de um familiar.
Não pode equiparar-se a perda de um braço pelo empregado, em acidente de trabalho, com a perda de um fornecedor da empresa em razão de ter tido título levado a protesto.
Pela própria natureza dos bens perdidos, a indenização de danos morais à pessoa jurídica deve restar em patamares bem inferiores aos daquela conferida aos indivíduos.
6.1 - Além do mais, o presente caso carrega características bem próprias, a exigir se levem em consideração alguns fatores relevantes para fixação do valor da indenização, se concedida for.
6.2 - O primeiro deles diz respeito ao porte econômico da Autora.
Segundo o seu contrato social, o seu capital é de R$ 10.000,00.
Ora, com um modesto capital, que reflete o valor do seu patrimônio, o alegado prejuízo não poderia jamais alcançar um valor quatorze vezes maior que aquele mesmo patrimônio! Um estranho prejuízo que simplesmente aumentaria quatorze vezes dito patrimônio. O dano teria sido muito maior do que o próprio negócio, o que é teratológico.
O que deve balisar a fixação do valor da indenização é o prejuízo que poderia o dano trazer ao habitual ganho ou lucro da empresa. Além disso, se configuraria o enriquecimento sem causa.
Assim, parece razoável ao ora Contestante que a indenização, se for concedida, o que se admite apenas para argumentar, seja fixada em valor igual a 10% do capital social declarado da Autora.
6.3 - Pelo que se infere das alegações da inicial, a primeira Ré teria pretendido, com emissão de outras duplicatas, receber o crédito duas vezes.
Daí, se não acolhida a alternativa posta no número 6.2, supra, há de aplicar-se analogicamente o artigo 1531, do C.C.B., que dispõe que aquele que demandar por dívida já paga fica obrigado a pagar ao devedor o dobro do que lhe houver cobrado.
A indenização pela conduta ilícita do credor, data venia do entendimento, agasalha reparação por dano extrapatrimonial, porque aí se configura o damnum in rem ipsa; vale dizer, o simples fato de se cobrar judicialmente dívida paga dá ensejo a indenização, independentemente de prova do dano. E essa indenização é tarifada.
Pela similitude do caso com a hipótese tratada no citado artigo 1531, do C.C.B., que cuida de dano extrapatrimonial, como já ressaltado, com fixação do valor da indenização, deverá ser tal dispositivo aplicado, em valor igual ao dobro da dívida quitada, isto se devida for a composição dos pretensos danos.
Aliás, o E. Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais assim entendeu na Ap. 160.196-1, 6a. C., Rel. Juiz Baía Borges, julgada em 26.05.94.
No corpo do voto condutor do acórdão, vêem-se os seguintes argumentos: “A fixação do valor da indenização em salários mínimos tem sido largamente utilizada pelo Judiciário. Aqui, no caso específico destes autos, um critério que poderia ser tido como razoável seria o de se fixar a condenação no valor dos títulos levados à protesto. Outro, que se mostra adequado ao caso em exame, e que, por isso, se adota, é o de fixar a indenização no dobro desse valor, com a adoção, por analogia, da norma estatuída no artigo 1.531, do C.C.B., até porque a sentença fez expressa menção aos artigos 1.530 e 1.532.”
6.4 - Cumpre registrar aqui que, na 49a. reunião do Centro de Estudos Jurídicos Juiz Ronaldo Cunha Campos, do qual são membros os juízes do E. Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, se estabeleceu, após a exposição pelo Juiz Geraldo Augusto sobre o tema “Valor do dano moral - Critérios objetivos de fixação”, chegaram às seguintes conclusões: “1 - Pedido de dano moral por inclusão indevida de nome em SPC-Serasa-Cartório de Protesto: até vinte salários mínimos; 2) Pedido de dano moral por morte de esposo, esposa, filhos - 100 salários mínimos; 3) Outras bases de pedidos: até 90 salários mínimos” (Ata da 49a. reunião, juntada em xerocópia, destaque do Contestante).
Crê o ora Contestante que, não acolhidas as alternativas dos números 6.2 e 6.3., supra, a indenização, se deferida, ficará no patamar de vinte salários-mínimos.
7. A Autora invoca lições doutrinárias sobre natureza de título causal da duplicata, tendo-as o ora Contestante por impertinentes, já que não vendeu mercadorias e nem emitiu duplicatas.
O mesmo se diz relativamente à incursão que faz no Direito Penal, vez que, repita-se, não emitiu o ora Contestante qualquer duplicata.
8. - Pelas razões acima expostas, requer o ora Contestante seja indeferida a petição inicial (artigo 295, inciso II, do C.P.C.) ou então seja extinto o processo sem julgamento do mérito (artigo 267, inciso VI, do C.P.C).
Requer mais, na hipótese de ser acolhida a tese de ilegitimidade do ora Contestante e não extinto o processo sem julgamento do mérito, seja o mesmo Contestante excluído do feito de plano, em decisão interlocutória.
Se inacolhidos os requerimentos supra, sejam os pedidos julgados improcedentes.
Atendido qualquer um dos pedidos supra, seja condenada a Autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários em favor do advogado da ora Contestante, em percentual incidente sobre a repercussão econômica do pedido, que alcança R$ 140.000,00.
Finalmente requer lhe seja deferida a produção de todas as provas admissíveis, em especial, testemunhal, documental, pericial e depoimento pessoal do representante legal da Autora.
Ainda não foram examinadas as preliminares suscitadas, vez que, até presente momento, não se conseguiu citar a primeira ré, possivelmente por já não mais existir.
Além disso, dada a pouca agilidade da Justiça, pode ser que as teses desenvolvidas na defesa não despertem mais discussões quando da prolação da sentença de mérito, época em que, possivelmente, já se terá boa e farta jurisprudência a respeito delas.